Estou a procura de uma natureza pictórica que se comunique de forma efetiva e afetiva com o olhar do outro, um trabalho que pregue a alegria, beleza, doçura e paz. Guiherme L. Motta
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Arquiteto, professor e afeiçoado às artes plásticas, nunca deixou de desenhar seus pensamentos. Desde criança, mais do que nas palavras, foi o desenho que o acompanhou na sua melhor forma de comunicar-se. Em sua formação, na escola, na faculdade, nas suas obras, ou como professor, mesmo na sua vida afetiva, foi o desenho que pautou seus melhores momentos.
[ Fazer do desenho via de conhecimento, experimentar, transformar em instrumento de compreensão do mundo que me cerca. Absorver os erros e transformá-los em soluções de equilíbrio e harmonia. Aceitar o incompreensível lidar com o incontrolável. Fazer da abstração uma figura e da figura uma abstração. Do entusiasmo o saber e da sensibilidade o guia. Traduzir o olhar através do desenho em matéria apreciável. Artista ou Arquiteto.... ]
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Dessa maneira ao pensarmos no Guilherme, fica difícil distinguir o arquiteto do artista, ou o artista do arquiteto; de uma forma ou de outra, é o desenho que revela sua pessoa colocando-o num mesmo plano de valor.
[ exercitei meus primeiros croquis e manifestações gráficas no campo da arquitetura… me refugiei na pintura dedicando meu tempo a pratica do desenho e da aquarela, queria entender o Brasil, educar o olhar, sair desenhando o que me sensibilizava ]
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Por sorte, acaso ou destino, teve o privilégio de nascer num ambiente familiar onde a cultura estava presente a todo instante. Seu pai, Flávio Lichstenfels Motta, conhecido artista, crítico de Arte e professor na FAU-USP, sua mãe Dione Lemke, formada em filosofia e letras, extremamente criativa, e seu avô, Ministro Candido Motta Filho, foram exemplos que estimularam sua capacidade de escolha na vida.
[ A casa de meu avô, conhecida por todos como “Bartirão”, abrigou a família Motta por várias gerações desde seu início. Foi sempre uma casa alegre e recebia todo mundo de braços abertos. Meu pai enchia a casa de amigos e minha mãe com seus múltiplos talentos, e muito trabalho, garantia a festa de todos. Foi nesse ambiente estimulante, com idas e vindas de pessoas interessantes, que cresci e me dei conta da diversidade da vida e das oportunidades oferecidas. Cresci em uma casa animada e criativa, uma casa de trabalho, como dizia meu pai ]
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Além do ambiente familiar, as amizades que construiu na juventude, colaboraram em muito no desenvolvimento de seus valores, como a afinidade com a música e no seu gosto por restauro de carros antigos.
[ Minha primeira experiência de ‘’restauro’’ não foi na arquitetura, mas sim com os restos de um violão quebrado transformado em uma guitarra elétrica inusitada, na qual, mais tarde, troquei por um Chevrolet Ramona 1929, em estado de conservação lastimável.]
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Talvez tenha aí, já se revelado, o prazer de trazer de volta, o brilho da existência do melhor de uma ruína considerada obsoleta.
[ me refugiei na pintura dedicando meu tempo a pratica do desenho e da aquarela, queria entender o Brasil, educar o olhar, sair desenhando o que me sensibilizava, por vezes influenciado pelos pintores viajantes que por aqui passaram, Debret Rugendas, Tauné, Hildebrandt e outros que tão bem retrataram o novo mundo. Uma nostalgia juvenil me impulsionava a selecionar lugares e paisagens a serem pintadas que a meu juízo estariam em vias de extinção ou em perigo. ]
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Estes anseios, também se revelaram ao trabalhar com a arquitetura junto ao patrimônio histórico, desde quando na juventude, saía com seus amigos, para fazer o levantamento das antigas fazendas de café, sempre estava desenhando.
[…feliz aproximação com o saudoso amigo Antonio Luis Dias de Andrade – JANJÃO, nos tornaríamos bons amigos e parceiros de trabalho tanto no gosto pelo desenho, quanto nos projetos de arquitetura e nas obras de restauro. A Biblioteca Cassiano Ricardo e o projeto de documentação do acervo arquitetônico e urbanístico de Jacareí foram oportunidades de convivência e trabalho juntos. ]
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Esse gosto se revela até em seus recentes projetos, como o Teatro Castro Alves em Salvador ou do Complexo Paineiras Corcovado no Rio, e outros. Quase sempre, em diferentes intensidades, se notam presentes, as tratativas do passado.
[ … fui com meus avos a Goiás Velho, também as antigas vilas de Planaltina e a Luziânia onde me lembro do casario e suas janelas recobertas de mica. O contato com aquele estupendo acervo ao longo do tempo encheu os olhos e me ensinou a ver o peso do passado e sua importância. Obrigou-me a considerá-lo como fator preponderante na formulação e no papel das proposições e traços de uma arquitetura que se pretenda genuína.]
é interessante notar algumas das características do processo do desenho de Motta, que ocorre de forma variada, conforme o projeto que lhe é apresentado. seus primeiros desenhos costumam ser, em geral, de reconhecimento do local onde vai intervir, seja um sitio natural, seja urbano. o croquis habilidoso, do livro….
[ nas primeiras idéias, como preciso ter uma visão muito geral do problema, como estou tateando por todos os lados, então prefiro dar um zoom raozável para por aquilo numa grande angular. Trabalho pequeno em folhas pequenas. À medida que controlo esse desenho ele vai aumentando de escala ]
Fazer uma aquarela é como saltar de paraquedas. Não há retorno. Cada pincelada está definitivamente comprometida. O bom desempenho reside no domínio do processo de trabalho em todas as etapas. Guilherme soube enfrentar estas dificuldades. Somou à sua sensibilidade as possibilidades infinitas de técnica, para obter um reino de luzes e transparências de rara sutileza.
Renina Katz
[ Despida de eloquência, ela tem vontade própria, mas possibilita a um atento observador, anotações rápidas e precisas quando da construção de atmosferas e luzes que se queria retratar. Ao mesmo tempo por sua delicadeza, exige do artista cuidados para que toda natureza contida em sua matéria flua livre e precisa. Não há espaço para o arrependimento ]
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Em todas as produções de Guilherme Motta, sua sensibilidade, conhecimento e valoração, se expressaram pautadas na linguagem pictórica, onde o tratamento das relações espaciais são questões primordiais; seja nas aquarelas surgidas de um instante passageiro, seja no raciocínio projetual de uma obra arquitetônica.
[ Escolhi as expressões culturais sedimentadas na experiência popular, com suas inúmeras formas de representação e linguagem como guia. Sua espontaneidade e exuberância, é suporte para o meu trabalho, matéria viva que indica a construções de novos caminhos. Fujo dos modismos e tendências. O Brasil é o meu tema. ]
[ Ser figurativo...
Ser abstrato...
Ser destro ou sinistro,
talvez, quem sabe, ambidestro.
Trabalhar sem modismos,
de forma singela,
sempre com o olhar atento
`as transformações. ]
[ Colocar parte do meu trabalho do passado sobre o trabalho do presente, me faz pensar na dualidade do tempo, na impossibilidade de reprodução fiel do passado, e as dificuldades de formulação do futuro. ]
[ A possibilidade de dedicar-se `a pintura me estimulava, foi um momento de aprendizado e de estudos, documentação de minhas idéias e viagens, de uma intensa produção.
A paisagem era o assunto predileto, sempre carregava meu material de pintura para onde quer que fosse. ]
Guilherme Motta chama a atenção para duas constantes na recente produção artística brasileira. Uma delas é o renovado interesse pela paisagem e por imagens do mundo exterior. Guilherme encontrou uma medida correta para suas imagens, onde há registros urbanos transformados pela incidência da luz. Casimiro Xavier de Mendonça